O que significam as birras?
As birras são uma parte natural e importante do desenvolvimento infantil, ocorrendo frequentemente entre os 18 meses e os 4 anos de idade. Este período de transição marca uma evolução significativa nas capacidades cognitivas, emocionais e sociais da criança, trazendo associados grandes desafios para os pais. As birras podem ser interpretadas de várias formas, e é essencial que os adultos compreendam que, muitas vezes, estas explosões emocionais são a forma de a criança expressar algo que ainda não consegue verbalizar ou gerir de outro modo.
Podem significar que alguma necessidade básica da criança não está satisfeita. Estas necessidades podem incluir fome, sono, ou até mesmo dor ou desconforto. Quando uma criança tem fome, por exemplo, o seu nível de frustração aumenta significativamente, e o seu comportamento pode refletir essa necessidade urgente. Da mesma forma, o sono insuficiente ou a presença de algum desconforto físico pode desencadear uma birra, já que a criança não possui ainda as ferramentas cognitivas ou verbais para expressar o que sente de forma clara.
Além disso, as birras podem ser uma manifestação do desejo da criança por autonomia. Nesta fase de desenvolvimento, a criança começa a perceber-se como um ser independente, com vontades próprias, mas nem sempre consegue expressar essas vontades de forma eficaz. Este desejo por autonomia, muitas vezes, entra em conflito com as regras impostas pelos pais ou cuidadores. A criança ainda não tem a capacidade de gerir essas frustrações ou de negociar de forma produtiva, resultando numa birra. Pode estar confusa sobre o que é esperado dela, não entender bem os limites estabelecidos pelos adultos, o que gera sentimentos de impotência.
Outra razão comum para as birras está relacionada com a necessidade de conexão emocional. As crianças pequenas, mesmo quando parecem estar a rejeitar os pais durante uma birra, muitas vezes estão a pedir atenção e proximidade. Podem não saber fazer esse pedido de forma saudável, mas as suas explosões de raiva ou frustração podem ser, na verdade, um grito de ajuda. Nestes momentos, o seu comportamento pode ser um reflexo de insegurança, medo ou desejo de proximidade com as figuras de apego.
É importante lembrar que durante a infância e até ao início da idade adulta, o córtex pré-frontal – a parte do cérebro responsável pela tomada de decisões, pelo controlo de impulsos e pelo pensamento lógico – ainda está em desenvolvimento. Por isso, nesta fase, a criança age predominantemente de forma impulsiva, sem ter a capacidade de refletir sobre as suas ações ou de se colocar no lugar do outro. A sua falta de flexibilidade emocional, combinada com a incapacidade de lidar com a frustração, torna as birras uma resposta comum a qualquer situação que não corra como esperado. Não conseguem ainda regular as suas emoções, o que resulta em grandes explosões emocionais. Portanto, as birras são, muitas vezes, o resultado de um conflito interno da criança, que está a aprender a gerir os seus sentimentos de forma autónoma, mas ainda não possui as ferramentas adequadas para isso.
Sendo assim, as birras podem indicar:
- Necessidades básicas não satisfeitas: Fome, sono ou desconforto podem desencadear birras, uma vez que a criança não consegue expressar diretamente essas necessidades.
- Desejo de autonomia: A criança começa já a perceber-se como um ser independente com vontades próprias, mas ao mesmo tempo não consegue expressá-las de forma adequada e fica frustrada.
- Necessidade de conexão emocional: A criança pode estar a pedir atenção ou proximidade, ainda que de forma desorganizada.

Como lidar com as birras?
Lidar com as birras pode ser um dos maiores desafios da parentalidade. No entanto, com paciência, empatia e algumas estratégias eficazes, é possível reduzir a frequência e a intensidade das birras, ao mesmo tempo que se ensina a criança a gerir melhor as suas emoções.
O primeiro passo é garantir que todas as necessidades básicas da criança estão satisfeitas, porque a causa de uma birra pode estar relacionada com a fome, o cansaço ou o desconforto físico. Manter horários regulares para as refeições e para o sono pode prevenir muitas situações de stress para a criança, evitando que estas necessidades não satisfeitas resultem em birras. Se percebermos que a criança está a reagir de forma negativa porque tem fome ou sono, a solução pode ser tão simples como oferecer-lhe um lanche ou proporcionar-lhe um momento de descanso.
Quando a birra ocorre, o mais importante é manter a calma. Gritar ou perder o controlo emocional apenas intensifica o estado de agitação da criança. Uma abordagem eficaz passa por validar os sentimentos da criança, reconhecendo a sua frustração e assegurando-lhe que o adulto está presente e disponível para ajudar. Pode, por exemplo, dizer: “Eu sei que estás muito zangado porque não querias parar de brincar agora. Estou aqui para te ajudar quando estiveres pronto para falar ou se precisares de um abraço.”
Quando a criança se acalmar, é importante conversar sobre o que aconteceu. Explicar à criança o que estava a sentir ajuda-a a começar a identificar e nomear as suas emoções. Juntos, podem pensar em alternativas que ela pode usar quando se sentir assim novamente. Por exemplo, sugerir que, em vez de gritar ou bater, ela respire fundo ou peça ajuda.
Por outro lado, é fundamental que os pais e cuidadores recorram ao reforço positivo sempre que a criança conseguir controlar as suas emoções de forma adequada. O reforço positivo não significa apenas elogiar o comportamento desejado, mas também reconhecer os esforços da criança para se acalmar, mesmo que o resultado não seja perfeito. Frases como “Vi que tentaste muito manter a calma, isso é excelente!” ou “Estou orgulhoso de como conseguiste respirar fundo antes de te irritares” ajudam a criança a perceber que os seus esforços são valorizados. Este tipo de feedback construtivo motiva-a a repetir esses comportamentos no futuro, pois associa o autocontrolo a algo positivo.
Além disso, pode ser útil transformar momentos potencialmente desafiantes em momentos lúdicos. Usar o humor ou uma brincadeira pode descontrair a criança em situações que normalmente poderiam desencadear uma birra.
Exemplo: Se a criança começa a mostrar sinais de frustração ao arrumar os brinquedos, os pais podem propor uma corrida divertida para ver quem arruma mais rápido. Este tipo de distração leve pode redirecionar a atenção da criança e ajudar a desviar a energia negativa, transformando uma situação de conflito em algo agradável e colaborativo.
Para ajudar a criança a desenvolver estratégias de autocontrolo, os pais podem sugerir atividades que permitam à criança expressar as suas emoções de uma forma segura e controlada. Uma sugestão criativa é incentivar a criança a “rugir como um leão” quando se sentir zangada ou frustrada. Esta prática permite à criança libertar a raiva de forma divertida, ajudando-a a externalizar a emoção sem causar danos a si própria ou aos outros. Outra abordagem eficaz é ensinar técnicas de respiração.
Exemplo: “respiração koala”, na qual a criança se senta ao colo do pai ou da mãe, com a barriga encostada ao adulto, e juntos respiram profundamente e de forma sincronizada. Esta técnica, além de acalmar, fortalece o vínculo afetivo entre pais e filhos, proporcionando um momento de conexão e segurança emocional.
Outra ferramenta valiosa para prevenir birras e promover o autocontrolo é a prática da meditação em conjunto. Mesmo atividades simples de meditação ou mindfulness podem ter um impacto profundo no equilíbrio emocional da criança.
Exemplo: Pedir à criança para fechar os olhos e imaginar-se num lugar calmo, como uma praia ou uma floresta, enquanto respira lentamente, pode ajudar a reduzir a ansiedade e impedir que a birra escale.
O “pote da calma” é outra estratégia prática e eficaz: trata-se de um frasco transparente cheio de água com glitter, que, ao ser agitado, representa a mente agitada da criança. À medida que o glitter vai assentar no fundo, a criança observa e acalma-se, percebendo que, tal como o glitter, as suas emoções também se podem acalmar com o tempo.
Estas estratégias, ao serem introduzidas de forma lúdica e consistente, ajudam a criança a adquirir ferramentas para lidar com as suas emoções de maneira autônoma e saudável, fortalecendo a sua autoconfiança e capacidade de regulação emocional.

O que nunca fazer?
Gritar, bater, agredir verbalmente ou chantagear são atitudes que, embora possam parecer uma resposta imediata para tentar controlar uma birra, na verdade têm consequências negativas para o desenvolvimento emocional da criança. Estas reações exacerbadas não só aumentam a tensão do momento, como também podem gerar ressentimento e raiva acumulada na criança. Ao ver o adulto, que é o seu modelo, perder o controlo, a criança não aprenderá a regular as suas próprias emoções, mas sim que a agressividade é uma forma aceitável de resposta. Isso pode levar a uma repetição desses comportamentos nos seus próprios contextos, como na escola ou com os amigos, perpetuando ciclos de agressividade ou desafio.
Outro ponto crucial é que ao utilizar gritos, violência física ou chantagem emocional, a criança não está a aprender a refletir sobre as suas emoções, nem a desenvolver as suas competências de autocontrolo. Em vez disso, estas abordagens geram medo ou obediência momentânea, mas não um entendimento sobre o que causou a birra e como lidar com essas emoções no futuro. De igual modo, pode criar uma relação de distanciamento e desconfiança entre pais e filhos, comprometendo o vínculo afetivo essencial para o desenvolvimento saudável da criança.
No entanto, se os pais perderem o controlo e adoptarem alguma destas posturas, é fundamental que assumam a responsabilidade por essas ações perante a criança. Pedir desculpa é uma atitude poderosa e educativa, pois mostra que errar é humano, mas que é importante reconhecer os erros e tentar corrigi-los. Este gesto também fortalece o conceito de responsabilidade mútua e ensina a criança que todas as emoções, inclusive as dos adultos, podem ser geridas de forma mais saudável.
Por fim, é importante lembrar que não existem soluções milagrosas ou fórmulas mágicas para lidar com birras. No entanto, algumas estratégias, como manter a calma, mostrar empatia e praticar a paciência, são ferramentas valiosas. Ser calmo e empático durante uma crise ajuda a criança a sentir-se segura, mesmo no meio do turbilhão emocional. Ao demonstrar paciência, os pais também estão a ensinar à criança que as emoções levam tempo a serem compreendidas e reguladas. Em última análise, estas abordagens mostram-se eficazes para criar um ambiente em que a criança se sente compreendida e apoiada, o que diminui a frequência e a intensidade das birras ao longo do tempo.