O que é a depressão?
A depressão é uma perturbação do humor, que se manifesta frequentemente como irritabilidade, tristeza e/ ou apatia e perda de interesse generalizado.
É importante não confundir tristeza e depressão, já que têm características diferentes. Os estados de tristeza são, por norma, passageiros e melhoram espontaneamente. Pelo contrário, na depressão, a vida do indivíduo é afetada nas diversas áreas do seu funcionamento – relacional, académica/ profissional, familiar, etc. -, e os sintomas de tristeza, irritabilidade e/ ou apatia intensificam-se e prolongam-se no tempo.
Alguém que sofre de depressão, tem frequentemente uma visão desesperançada do futuro, percepcionando-se como incapaz de tomar decisões acertadas, de ser compreendido pelos outros ou até de vir a ter uma vida melhor. Muitas vezes isola-se, incapaz de se relacionar com os outros e apresenta sintomas físicos, como cansaço excessivo, dores infundadas e variações de sono e apetite. A intensidade do mal-estar e a falta de esperança no futuro levam, por vezes, os indivíduos a adotar comportamentos desajustados mais extremos, como o consumo de substâncias – álcool e drogas-, ou mesmo o suicídio.
A depressão é uma perturbação apenas dos adultos?
Não.
A ideia de existirem quadros depressivos na infância nem sempre foi bem aceite, mas sabemos hoje que esta perturbação pode iniciar-se em idade pré-escolar. Só nos anos 80 surgem as primeiras referências de critérios de diagnóstico para a depressão infantil e é oficialmente reconhecida a sua existência. Este reconhecimento tardio relaciona-se, entre outros aspetos, com o facto de a infância ser muitas vezes idealizada como uma fase de grande felicidade, alegrias e conquistas, bem como um período em que as preocupações e a tristeza são ligeiras e transitórias.
Os sintomas da depressão são idênticos em todas as idades?
Não.
Apesar de inicialmente se terem definido critérios comuns para adultos, adolescentes e crianças, rapidamente se percebeu que fatores como a maturidade cognitiva, linguística e emocional são responsáveis pelas diferenças nos sintomas e que, por esse motivo, diferentes idades apresentariam também diferentes sintomas em função do nível de desenvolvimento.
A perturbação depressiva na infância/ adolescência é mais comum em meninos ou meninas?
Estudos sugerem que a diferença entre géneros é reduzida em crianças mais pequenas, no entanto, parece verificar-se uma maior prevalência em jovens do sexo feminino, na adolescência.
Quais os sintomas de depressão na infância e adolescência?
Os sintomas da depressão variam de pessoa para pessoa, mas de uma forma geral uma pessoa deprimida pode manifestar um estado de humor recorrente de irritabilidade ou disforia (tristeza), frequentemente acompanhados por uma intensa sensação de desmotivação, desinteresse generalizado e diminuição dos comportamentos funcionais da criança ou adolescente.
Nestes jovens, observam-se alterações de comportamento que podem passar por variações de apetite e do sono, bem como do nível de atividade motora – atividade ou quietude excessivas. São muitas vezes observados comportamentos reveladores de baixa autoestima e de sentimentos de culpa. O adolescente ou criança com depressão revela habitualmente dificuldades em concentrar-se e em tomar decisões e pode manifestar ideação suicida ou mesmo concretizar uma ou mais tentativas de acabar com a vida.
As manifestações variam ao longo do desenvolvimento da criança/adolescente.
As crianças em idade pré-escolar não são capazes de elaborar a tristeza de outra forma e, por isso, queixam-se frequentemente de dores de barriga, cansaço e outros sintomas físicos. Por vezes, mostram-se intolerantes à frustração, agressivos e desinteressados e melancólicos nas brincadeiras. Podem ter “birras” sucessivas, mostrar-se muito irritados, sofrer variações de apetite e de sono e até mesmo vivenciar um atraso na aquisição ou regressão de marcos de desenvolvimento (por exemplo voltar a fazer chichi na cama – enurese).
Agitação extrema ou quietude excessiva são outros sintomas possíveis nesta idade. Podem também proferir afirmações negativas a respeito de si própria, indo até ao extremo da autoagressão. É ainda possível que apresentem sintomas fisiológicos (em menor escala), mas é mais comum observar comportamentos que resultam em ruturas, quer nas relações com os colegas, quer ao nível de uma diminuição do rendimento académico, acompanhado de uma desmotivação que se estende a outras áreas da vida. Estes jovens podem também irritar-se com maior facilidade e tornar-se mais agressivos para os que estão em seu redor. Com frequência podem surgir ameaças de suicídio.
Os adolescentes têm uma maior facilidade em comunicar as suas emoções face às crianças mais novas. Experienciam sentimentos de inferioridade, culpa e inutilidade e têm uma visão negativa de si mesmos, dos outros e do futuro. Os dilemas naturais desta idade, por exemplo, a procura de autonomia face aos cuidadores, pode levá-los a evitar pedir o apoio da família, o que pode exacerbar o seu isolamento.
Em alguns casos, pode sentir-se impacto no sucesso escolar e apresentarem variações repentinas nas notas, no comportamento e no absentismo escolar.
Também podem observar-se perturbações do comportamento alimentar, com impacto na saúde do adolescente e na sua dinâmica familiar, e manifestações de irritabilidade e/ou agressividade.
Nesta fase podem, adicionalmente, manifestar-se alguns comportamentos de risco, como o consumo de substâncias nocivas – álcool e estupefaciente, relações sexuais desprotegidas, infração de regras e leis, e tentativas de suicídio, que podem resultar da crença de que a sua situação atual não se vai alterar.
Quais são as causas da perturbação depressiva na infância/ adolescência?
Como em qualquer perturbação do foro psicológico, as causas são diversas e pode ter origem em vários fatores, nomeadamente, fatores genéticos, neurobiológicos e o próprio temperamento do indivíduo. Também os fatores ambientais, sobretudo os associados à família e ao grupo de colegas e amigos da criança/ adolescente, assumem um papel muito importante. Por exemplo, as situações de negligência ou trauma infantil podem aumentar a vulnerabilidade à depressão.
Por outro lado, o isolamento, que é característico da depressão, pode resultar de dificuldades nas estratégias de resolução de problemas que podem levar a comportamentos agressivos, passivos ou ambos, e ainda a comportamentos de evitamento.
Qual a relação entre depressão na infância e adolescência e o risco de suicídio?
Apesar de não existir um método totalmente eficaz para identificar as pessoas com risco acrescido de suicídio, verifica-se que a depressão é a perturbação que mais aparece associada ao suicídio. Esta associação poderá relacionar-se com o sentimento de desesperança, presente em muitas situações de depressão e considerado um dos principais indicadores da propensão para o suicídio. O sentimento de desesperança resulta numa visão negativista e derrotista do futuro que pode levar a que o jovem deixe de acreditar que é possível alterar o sofrimento em que se encontra, levando-o a sentir-se sem alternativas e sentir que a única forma de terminar com a sua angústia é o suicídio.
A psicoterapia pode ter um papel muito importante na prevenção e intervenção nestas situações através de uma abordagem que envolva a família e que tem em conta as características do adolescente e o seu contexto social. Por um lado, identificam-se fatores de risco, por outro, são identificados elementos na rede de apoio da criança/ adolescente para colaborar na implementação de um “plano de ação” que diminua o risco do jovem tentar o suicídio. Um dos fatores de risco mais amplamente verificado é a existência de uma tentativa de suicídio anterior. Existem outros fatores, como a exposição precoce a situações de vida difícil – trauma ou negligência, por exemplo – que podem tornar o jovem indivíduo mais vulnerável a situações de stress, levando-os a desenvolver uma visão distorcida da realidade, típica da depressão, e a sentir dificuldades em gerar alternativas para a resolução dos seus problemas. Por sua vez, estas dificuldades podem traduzir-se em comportamentos disfuncionais e desajustados na relação com os outros, resultando em isolamento e incapacidade de gerir os conflitos interpessoais.
A automedicação e o consumo de substâncias como álcool e drogas, e até mesmo a automutilação podem ser as únicas estratégias evidentes para estes jovens, que podem começar a pensar no suicídio como a única alternativa possível.
Como pode um psicólogo ajudar na depressão na infância e adolescência?
Na intervenção psicoterapêutica o envolvimento dos pais é fundamental através da utilização de estratégias eficazes, que favoreçam a relação, a comunicação e a compreensão das necessidades da criança e/ou adolescente.
O psicólogo intervém junto dos pais no sentido de sensibilizá-los relativamente a comportamentos de segurança a adotar com o jovem, bem como colaborar na construção dos passos a dar em situações de risco emergente. O papel dos amigos e dos professores mostra-se também muito importante, sobretudo se estes forem considerados figuras de referência pela criança/ jovem.
A intervenção psicoterapêutica poderá ajudar o jovem a melhor entender a relação entre os pensamentos, as emoções e comportamentos e os seus sintomas depressivos, assim como a melhorar as suas capacidades de regulação e gestão das emoções.
O psicólogo poderá, também, auxiliar o jovem no seu funcionamento social, ajudando a reparar as suas relações com os outros e promovendo a sua comunicação com a família e restantes elementos da sua rede de apoio.
Com crianças mais pequenas, o psicólogo intervém habitualmente através de estratégias mais lúdicas como a ludoterapia, recorrendo ao uso de brinquedos e outros materiais lúdicos para promover desta forma a expressão do mundo interno e conflitos emocionais da criança.
Se identifica no seu filho alguns sinais que poderão ser sugestivos de depressão, recomendamos que recorra à ajuda de um profissional da Psicologia.
Nós acreditamos que podemos ajudar. Acredite também!
Bibliografia
LOBO ANTUNES, Nuno (Coord.). Sentidos: o grande livro das perturbações do desenvolvimento e comportamento, do autismo à hiperatividade, da adição à internet à dislexia. Alfragide: Lua de papel, 2018.
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PETERSEN, Circe Salcides; WAINER, Ricardo (Org). Terapias Cognitivo-Comportamentais para Crianças e Adolescentes: ciência e arte. Porto Alegre: Artmed, 2011.
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